Falar de Caneças é relembrar um passado ligado à exploração aguadeira, cujas águas límpidas, incolores e inodoras, de sabor férreo, e de temperatura inferior à da atmosfera eram recomendadas no tratamento de anemias e na convalescença de outras enfermidades. Estas qualidades da água foram favoráveis ao tratamento de doenças do estômago, bexiga, fígado, rins, diabetes e dos intestinos.
Desde tempos remotos, os habitantes da povoação de Caneças enchiam de água bilhas de barro que faziam transportar até à Capital.
Assim, sobre o dorso dos animais, em carroças, em galeras e, posteriormente, em camionetas, o comércio aguadeiro foi crescendo, tornando-se numa das actividades económicas mais importantes para os habitantes e também uma das fontes de receita da freguesia. As qualidades naturais da água permitiram desenvolver o comércio da venda da água, ligado ao aparecimento de diversas fontes, onde se constituíram empresas familiares e sociedades.
Dependente da exploração das águas surgiu uma outra indústria, que foi a do fabrico das tradicionais bilhas de barro da região saloia, que serviam para o transporte da mesma. As enchedeiras e os aguadeiros são duas das ocupações associadas à actividade da venda da água, que fazem parte da memória colectiva.
Além das qualidades salutares da água, do ar e dos inúmeros espaços verdejantes, também a actividade laboriosa das lavadeiras tornou conhecida Caneças.
Não esqueçamos o filme Aldeia da Roupa Branca, as telas inspiradas nas lavadeiras, entre outras manifestações culturais.
Actividade ancestral, das mulheres deste lugar, foi um contributo importante para o sustento das famílias, ocupando um número significativo de mão-de-obra feminina, a par das enchedeiras das bilhas de água e das mulheres que trabalhavam na lavoura.
As lavadeiras com o mérito que lhe é reconhecido tratavam com esmero a roupa das freguesas que recolhiam em Lisboa ou arredores. Junto das ribeiras, dos rios ou das almácegas dedicavam-se ao tratamento da roupa.
Também o crescimento desta actividade fez surgir lavadouros públicos e privados onde as lavadeiras por conta própria ou sob orientação de outros procediam à lavagem das peças de roupa.
Após uma semana dedicada ao trato da roupa, as lavadeiras procediam à sua entrega, utilizando o dorso dos animais, as carroças, as galeras e, mais tarde, as camionetas de aluguer.
A pouco e pouco, esta actividade assistiu ao desaparecimento das lavadeiras devido ao aparecimento da água canalizada que permitiu assim criar espaço para a existência de um tanque nos interiores das habitações, das máquinas de lavar roupa, levando as gerações mais novas a procurarem outros afazeres.
Progressivamente, os lavadouros deixaram de ser utilizados o que deu lugar à degradação ou desaparecimento de alguns destes locais.
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"Ó rio não te queixes,
Ai o sabão não mata,
Ai até lava os peixes,
Ai põe-nos cor de prata.
Três corpetes, um avental,
Sete fronhas, um lençol,
Três camisas do enxoval,
Que a freguesa deu ao rol."
"Água fria, da ribeira,
Água fria que o sol aqueceu,
Velha aldeia, traga a ideia,
Roupa branca que a gente estendeu.
Um lençol de pano cru,
Vê lá bem tão lavadinho,
Dormindo nele, eu e tu,
Vê lá bem, está cor de linho." |
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