Bem vindo a esta cache que
lhe dá a conhecer as Ruínas de Abul, (ou a Feitoria Feníncia como
também é conhecida) que terá sido um importante centro romano de
olaria, tal como terá sido o local onde estava a cache
Fornos do Pinheiro, a cache “irmã” desta.
Esta cache surge como a 2ª
sobre este tema, mas também como alternativa à outra colocada
dentro da Herdade do Pinheiro, uma vez que a dona da herdade, sem
razão aparente, mandou fechar o local das ruínas apesar de ser um
local de Interesse Público reconhecido pelo IPAAR. Depois de alguns
contactos com as entidades competentes não obtive uma resposta
conclusiva sobre este assunto. Decidi então avançar com esta cache
neste local até porque ele só por si é magnífico e merecedor desta
cache, quer pela paisagem quer pelo enquadramento
histórico.
Obrigado ao geocacher
Almeidara pela força que me deu para a colocação desta
cache!:)
O
Local
A cache encontra-se na
Estação Arqueológica de Abul, um local que terá sido um importante
estabelecimento comercial do século VII-VI a.C. de fundação
Fenícia.
As notícias sobre o grande
complexo de Abul remontam aos anos 70 do século XX, quando foi dada
a conhecer a notícia sobre o Pinheiro (Almeida, Zbyszewski e
Ferreira 1971). Estes autores, na resenha que fizeram dos
fornos romanos conhecidos em Portugal, referiram-se a: "(...) mais
dois[fornos] na Herdade do Monte Novo a caminho do Monte da Abula.
Nesta última localidade há uma colina juncada de restos de cerâmica
para construção, lusitanoromanos. Tratar-se-á de mais um forno
ainda enterrado?“ (Almeida, Zbyszewski e Ferreira 1971, 159). A
partir de então, o local passou a constar obrigatoriamente em
qualquer notícia sobre a produção oleira do baixo Sado; no entanto,
só recentemente ali se realizaram escavações, que vieram revelar um
local mais complexo do que se supunha. De um ponto de vista
espacial, os autores da escavação identificaram uma ocupação de
época romana, instalada junto de construções orientalizantes, logo
no primeiro terço do séc. I d.C. (Abul A). O centro oleiro
propriamente dito terá começado a laborar na época de Cláudio,
fabricando cerâmica comum, de paredes finas, pesos, etc.;
regista-se igualmente a produção de ânforas (e respectivos
opérculos), com apreciável variedade formal, ao nível dos
detalhes.
Nos meados do século I d.C.
foi instalada uma bateria de cinco fornos cerâmicos de planta
circular, com canal central, grelha suportada por arcos paralelos
entre si e perpendiculares ao eixo central do forno, com uma parede
de fachada comum. Esta fachada teria um alpendre suportado por
pilares.
No que diz respeito às
ânforas fabricadas, o padrão de Abul não é muito distinto do
identificado no Pinheiro. Para lá da fase inicial, aquilo a que os
autores da escavação chamaram a fase de ensaio para a criação de um
novo tipo de ânfora (também documentado no Pinheiro. Toda a bateria
de fornos terá funcionado durante este período, excepto o forno nº
1, convertido em forno de cal. No período entre os fins do séc. II
e os inícios do III d.C., uma vez mais, regista-se um abrandamento
da laboração, com a diversificação da produção, seguida de uma
retoma, que parece ter durado até aos meados do séc. III, época em
que o local foi abandonado, devido a causas relacionadas com a
alteração do nível médio das águas do Sado. Nas suas proximidades
terá surgido então Abul D, que terá funcionado, fabricando
igualmente ânforas, durante os séculos IV e V.
À semelhança do verificado no
Pinheiro, produziram-se aqui contentores idênticos ao encontrados
nos fornos junto à cache
Fornos do Pinheiro.
Foi também escavada uma
estrutura de armazém, que terá acompanhado toda a vida do centro
oleiro, ainda que não tenha sido possível determinar o momento
preciso da sua construção. Embora não seja fácil enquadrar o centro
oleiro no contexto do povoamento romano do baixo Sado, há vários
elementos relevantes a reter. Em primeiro lugar, a abundância de
materiais importados, documentada na primeira fase da ocupação do
sítio (sigillata itálica, “paredes finas” e cerâmicas oriundas da
Baetica), esclarece cabalmente sobre o carácter romano do arranque
da actividade oleira, sugerindo mesmo que se trataria de uma
actividade relacionada com elites (entenda-se, a propriedade da
figlina). Um segundo aspecto interessante, é justamente a enorme
similitude com a história do vizinho complexo do Pinheiro, o que
nos dá uma clara ideia de que há uma dinâmica comum a vários dos
centros oleiros sadinos, se não mesmo lusitanos, em sentido lato,
uma vez que no Morraçal da Ajuda e em lugares do baixo Tejo se
observam óbvias semelhanças em todo o processo. Finalmente, o
abandono da Abul A, por razões ecológicas e a sua possível
substituição por Abul D (que, sublinhe-se, não foi objecto de
escavações), alerta-nos, a um tempo: para a importância que os
fenómenos naturais poderão ter para a história concreta de cada
local, cujas dinâmicas de utilização se poderiam explicar em outros
quadros, que não os meramente económicos; e para a necessidade de
proceder com redobradas cautelas na hora de interpretar a
contabilidade dos centros oleiros das distintas regiões, já que
alguns poderão ter desaparecido em virtude de micro transformações
ecológicas, imperceptíveis a uma escala mais ampla, conhecendo
continuidades em paragens próximas, mas imunes a estes
microfenómenos.
Um pouco de
história...os Romanos e os fornos
Na História do Império
Romano, a Lusitânia e em particular a região dos estuários dos rios
Tejo e Sado, são importantes por possuírem a maior concentração de
unidades industriais de preparados de peixe de todo o
Império.
O clima e a morfologia do
curso inferior do Sado, associados a uma costa muito rica em
peixes, possibilitaram que aqui, se tivesse desenvolvido uma
importante indústria de conserva e transformação do
pescado.
Complementarmente, houve
necessidade de extrair o sal em grandes quantidades, fabricar
barcos, anzóis e redes, construir cetárias, armazéns, fornos e
habitações, e comercializar as produções. Estas actividades não só
dinamizaram economicamente o Sado, como também para aqui trouxeram
pessoas provenientes de outras regiões da Romanidade, de diversos
costumes e religiões.
Sem posterior conservação,
muito reduzida ficaria a importância da pesca, já que o consumo de
peixe fresco, se restringiria às zonas litorais e fluviais. No
Sado, os romanos salgaram o peixe ou transformaram-no em produtos
comestíveis: garum, liquamen, hallec, muria.
Estes produtos eram envasados
em recipientes cerâmicos, potes e ânforas, e comercializados a
grandes distancias, atingindo os mais diversos mercados.
A indústria piscícola apenas
se pode desenvolver graças à existência de barreiros e lenhas nas
margens do Sado, que permitiram fabricar os contentores.
A quantidade de fornos de
ânforas que já foram descobertos, mais de duas dezenas, permitem
compreender a forma como se organizava a produção, graças à analise
das marcas que as ânforas ostentavam.
Assim, encontramos marcas
estampadas, com o nome do produtor das ânforas e marcas
esgrafitadas, gravadas antes da cozedura, controlando a
produção dos oleiros.
As pastas das ânforas são
muito características, brandas e arenosas, quartzíticas e micáceas,
geralmente de textura folheada, totalmente distintas dos fabricos
norte-africanos e béticos.
Os fornos do Sado são de
planta circular, em conjuntos que optimizam os custos da produção.
As mesmas razões económicas levaram-nos a obedecer a um padrão
locativo: próximo de barreiros, em terra firme, imediatamente junto
à água e em zonas acostáveis, com fácil acesso à lenha, aos barros
e ao transporte.
Sob o ponto de vista
produtivo, o baixo Sado comportava-se como um todo, articulando-se
à volta da indústria piscícola, que quase monopolizou a sua
indústria.
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