O nascimento de Aquilino foi registado em 7
de Novembro de 1885 na Igreja de Alhais, concelho de Vila Nova de
Paiva - ao tempo, concelho de Fráguas - , data em que o baptismo
foi oficializado pelo cura Luís Machado de Morais.
Contudo, "nasceu na freguesia do Carregal,
concelho de Sernancelhe, diocese de Lamego, à uma hora da tarde do
dia treze do mês de Setembro do mesmo ano, filho natural e primeiro
de Mariana do Rosário, solteira, criada de servir…" É o que
consta do registo.
Nasceram também no Carregal os seus dois irmãos: o Melchior - o
Quinzinho do livro Cinco Reis de Gente - em 10 de Setembro de 1888
e a Maria do Rosário em 2 de Outubro de 1889.
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A menina terá falecido cedo, mas o
Melchior acabou seus dias em Soutosa em 30 de Junho de 1967.
Conheci-o muito bem. Era proprietário e exercia também o ofício de
serralheiro.
Dos registos consta serem filhos naturais, porque assim tinha de
constar. O pai tinha especiais responsabilidade na freguesia, mais
concretamente na paróquia e, por isso, as cerimónias oficiais do
baptismo e registo de nascimento do Aquilino e da Maria fizeram-se
fora da freguesia onde nasceram: as do primeiro em Alhais, as da
sua irmã em Gradiz, freguesia muito próxima do Carregal. O pároco
dos Arcozelos, José da Fonseca Ambrósio, deslocou-se expressamente
ao Carregal para baptizar o Melchior, com autorização do abade
local.
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Mariana do Rosário (Gomes, do apelido de seu
pai Filipe) tinha nascido em Soutosa, freguesia de Peva em 4/7/1851
e, mais tarde, foi trabalhar no Carregal, como governanta da casa
de Joaquim Francisco Ribeiro, este ali em serviço como responsável
da paróquia, mas também natural de Soutosa. De relações entre os
dois nasceram esses três filhos, que o pai perfilhou e reconheceu
por escritura de 6 de Setembro de 1890, lavrada por Adelino Amado
dos Santos Leite, notário de Sernancelhe.
Joaquim Francisco Ribeiro prestou serviço no
Carregal desde Janeiro de 1879 até Março de 1895. Antecedeu-o o P.e
encomendado João de Sobral e substituiu-o o P.e José Gomes
Oliveira.
Não consta que ele tivesse residido, enquanto ali serviu, noutra
casa que não aquela onde a Câmara Municipal procedeu a
beneficiações.
Caso se pretendesse ocultar o nascimento da criança, aceitava-se
que a futura mãe se ausentasse, embora
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temporariamente para a sua terra natal - a
distância entre Soutosa e o Carregal percorre-se a pé, em menos de
duas horas.
Uma vez que o nascimento ocorreu neste último povo, é de presumir
que o local tenha sido a casa onde o pai e a mãe residiam, embora
se possa colocar a hipótese de esta se ter desviado para casa de
pessoal de confiança que ajudasse naquela hora e , até para
resguardo do bom nome da residência paroquial.
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A casa a relembrar será, portanto, esta
residência, onde viviam os pais à data do seu nascimento. E, mesmo
que seus pais ainda ali não residissem naquele ano de 1885, nem por
isso o lugar deve ser esquecido, porque foi lá que ele começou a
abrir os olhos para o mundo que o rodearia e que tão bem viria a
descrever ao longo de inúmeras páginas dos seus livros.
Se vier a atender-se apenas ao próprio local em que se nasce, não
faltarão no futuro placas alusivas nas Maternidades, enquanto o
respectivo berço, o mais importante, acabará por ficar no olvido
das gerações vindouras!
Àquela casa se refere o escritor, com muito
carinho e saudade, no "Cinco Reis de Gente", com muito de
autobiográfico - " o actual romancito exprime o retorno que
efectuei sobre esse passado, já bem longínquo mas
ainda
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inebriador" - diz no prefácio. Lá estão o
"grande e desmantelado (agora bem composto) pátio fidalgo" e os
dois vetustos ciprestes de que "recebia uma lição de altitude e
firmeza".
Manuel Mendes publicou em 1960 o livro " Aquilino Ribeiro", a Obra
o Homem e a páginas 17 colocou uma fotografia em que nos parece
Aquilino e a segunda esposa D. Jerónima, filha do ex-Presidente da
República Bernardino Machado, à frente duma casa, hoje remodelada,
que, segundo me disseram pessoas antigas da freguesia, estaria
dentro daquele pátio. Por baixo da fotografia, a legenda: "
Aquilino, com a esposa, diante da casa onde nasceu, em Carregal,
Sernancelhe". O biografado ainda viveu mais três anos. Terá
desmentido alguma vez essa legenda?
Em conclusão: o nascimento de Aquilino está
mesmo relacionado com aquele local, embora eu admita que sua mãe se
tenha socorrido, naqueles dias, de casa de pessoa amiga, onde
encontrasse o auxílio necessário.
Por vezes, os biógrafos mencionam Carregal da Tabosa. A verdade,
porém, é que a sede da freguesia foi sempre o Carregal, sendo
Tabosa apenas um povo anexo, onde ainda se admiram as ruínas do
antigo Convento que, segundo o Abade Vasco Moreira em "Terras da
Beira - Cernancelhe e o Seu Alfoz", foi fundado em 1690 por D.
Maria Pereira, viúva, para freiras descalças, seguidoras da regra
de S. Bento. E que foi extinto em 1834, à semelhança do que
aconteceu com os outros conventos portugueses.
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Joaquim Francisco Ribeiro viveu os seus
últimos anos em Soutosa na sua casa, onde faleceu em 26/8/1918 e
que depois pertenceu ao escritor e agora é morada da Senhora Dra.
D. Maria Josefa de Campos, viúva do Juíz Conselheiro Anibal
Aquilino e sede da Fundação Aquilino Ribeiro.
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Mestre Aquilino deixou-nos em 27 de Maio de
1963 e eu assisti ao seu funeral em Lisboa no dia da tragédia da
derrocada do Cais de Sodré. Tive o privilégio de o ver algumas
vezes na sua casa de Soutosa e foi meu avô paterno quem lhe
arranjou esconderijo numa das sua fugas da prisão, como contei,
mais pormenorizadamente, no meu livro "Ariz - um pouco da sua
história". É por isso que me não é indiferente tudo o que se
relaciona com a vida de um homem, que escreveu, além do mais, para
cima de 70 livros. É obra!. "A meia grosa de livros que escrevi
foram de facto para mim … como igual número de vinhas que
plantasse ", diria em Quando os Lobos Uivam. Relembrá-lo naquele
pátio, onde a Câmara efectuou obras, não é retirar direitos de
propriedade a quem os tenha. É , pelo contrário, acrescentar algo
mais ao que antes existia.
Esperemos que todos compreendam a boa intenção da edilidade,
presidida pelo Sr. Dr. José Mário Almeida Cardoso. Os vindouros,
que não tardarão a chegar, ficarão reconhecidos e registarão com
agrado toda a visão larga de quem os antecedeu, relativamente aos
homens que me deixaram obra a enriquecer o
futuro.
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