Ao chegarem à antiga Lixeira que já está desactivada há mais de nove anos, o Luis tentando não parecer aterrorizado pediu: “Vamos embora daqui, eu odeio este lugar”.
“Deixa de ser medroso” – respondeu o Arnaldo. “Vamos até a casa abandonada que está daquele lado e dar uma olhada, estou a precisar de uma aventura.” – referiu ele com a voz excitada.
António riu e começou a andar em direcção à casa, os outros dois seguiram-no. Aproximaram-se da entrada das ruínas da antiga casa do Guardião da Lixeira e olharam para ela, que em tempos era grande e tenebrosa ao mesmo tempo.
Os três jamais viram alguém a morar naquele lugar, o dono da propriedade abandonou-a à mais de cinquenta anos e nunca mais voltou, nunca vendeu ou alugou. Os moradores da região até evitam passar perto com medo, dizem que o lugar é assombrado.
Alguns anos antes o filho do proprietário, neto de um homem muito importante da aldeia vizinha, ia casar-se com uma linda mulher que morava noutro lugar. No dia do casamento, oito de Dezembro, o seu melhor amigo levou-o à sua futura casa dizendo que lhe queria mostrar algo. Chegados lá, ao entrar no quarto onde a noiva dormia, encontram-na na cama com outro homem. Num momento de desespero o noivo saca de uma faca e mata a noiva e o amante. Momentos depois, ele não conteve a agonia e enfiou a faca no seu coração. Supostamente os fantasmas dos três ficaram na casa onde diz a lenda que o fantasma do noivo tortura os outros.
Arnaldo foi o primeiro a entrar, pulou as pedras e os troncos e foi em direcção à casa. Olhou para trás e viu os outros dois a saltar também e continuou até chegar à porta. O Luís ficou parado no meio do caminho.
“Eu não entro, estou a sentir-me mal, alguma coisa me diz que deveríamos ir embora.” – disse o amigo com voz trémula.
Os outros dois não deram importância. Voltaram-se para a casa e olharam pela porta. Eles espantaram-se porque podiam ver muito bem o que tinha dentro da casa somente com a iluminação da lua que entrava pelo telhado que já não existia. E no seu imaginário, a sala de entrada era enorme e toda a mobília parecia estar lá, porém coberta com lençóis.
“A porta da frente esta aberta!!.” – Disse António.
Os dois entraram, o lugar noutros tempos devia ser lindo, descobriram restos de alguns móveis, mas parecia que mais alguém estava ali presente.
Momentos depois Arnaldo disse “ António, vamos embora, vamos embora, que o Luís está lá fora á nossa espera.” – Gritou Arnaldo para que seu amigo pudesse escutá-lo.
António não respondeu, o Arnaldo virou-se para ir até a saída e deu de caras com alguém, não pôde ver quem era porque a luz vinha de trás da pessoa, apenas se via o vulto. Uma coisa ele tinha certeza, era um Homem alto vestido de negro. Seu corpo congelou e riu tentando disfarçar o susto.
“Essa foi boa António, quase me mataste de susto. Vamos embora, já tive muito para uma noite só, este lugar já me está a dar arrepios.” – disse Arnaldo irritado.
António continuou calado. Arnaldo ficou inquieto olhando o suposto amigo e começou a andar em sua direcção, aquele vulto negro também moveu-se ao seu encontro. Algo mudou na visão de Arnaldo, parecia que o vulto tinha puxado uma faca de lado, ele começou a ficar preocupado e parou de andar.
“As Brincadeiras têm limites, pára com essas coisas António.” – gritou ele.
Aquele vulto grande e negro também parou de andar, a luz da lua iluminou o interior do capote e Arnaldo gritou. A imagem o aterrorizou e ele se arrependeu de ter entrado na casa. Ali na sua frente estava o fantasma do noivo, ausência de rosto não expressava sentimento mas mesmo assim ele sentiu que o ia matar.
“António!” – foi a única coisa que ele conseguiu gritar, pois o terror o mantinha congelado e sem ar.
António apareceu rapidamente, quando viu a cena correu directo para a porta a gritar. O Luís estava bem perto, apenas a quatro passos, mas parecia que não o ouvia nem via. O Homem de negro não lhe deu muita atenção, ele continuava apenas a encarar o Arnaldo que por sua vez correu para ajudar o amigo.
“Pensaste que ias escapar de mim por toda a eternidade malandro?” – disse o fantasma se aproximando dos dois.
O noivo agarrou Arnaldo pelo cabelo e apunhalou no coração. O rapaz ficou a agonizar por um tempo enquanto António fazia a sua última oração.
“Desaparece daqui tu não tens nada a ver com esse traste.” – disse o noivo.
“Não, por favor António” – gritou Arnaldo.
António assustou-se ainda mais ao ver o espírito de Arnaldo segurado por aquela coisa.
Lembrou-se da lenda daquela casa e então entendeu que aquele homem grande vestido de negro era a reencarnação do Guardião da Lixeira que se tinha apunhalado ali mesmo, correu e levou o Luís embora com ele.
Contou a história a todos, mas ninguém acreditou. O corpo de Arnaldo nunca foi encontrado pelas autoridades que vasculharem toda a casa e os arredores.
António foi internado seis dias depois, dizia estar a ser assombrado pelo fantasma do Guardião da Velha Lixeira.
E quanto a casa, continua lá, sozinha e sombria,
talvez à espera de uma visita tua...