Estou velha!!!
Acharam que não sirvo para mais.
Puseram-me de parte; junto aos tais
que formam a fila dos reformados,
e velhos enjeitados, mal amados.

Que velhos?
Sempre temos alguma serventia!
O trapo a utilizar no dia a dia,
durou e foi bonito, enquanto novo.
Hoje, ao rever-me nele, me comovo.

Atelier de pintor, ou oficina,
todos lhe dão valor; ele termina
os seus dias nas mãos do grande mestre.
Aquele velho trapo-desperdício,
ainda traz a todos, benefício.

Os Velhos Todos nasceram velhos — desconfio.
Em casas mais velhas que a velhice,
em ruas que existiram sempre — sempre
assim como estão hoje
e não deixarão nunca de estar:

soturnas e paradas e indeléveis
mesmo no desmoronar do Juízo Final.
Os mais velhos têm 100, 200 anos
e lá se perde a conta.
Os mais novos dos novos,
não menos de 50 — enorm'idade.

Nenhum olha para mim.
A velhice o proíbe. Quem autorizou
existirem meninos neste largo municipal?
Quem infrigiu a lei da eternidade
que não permite recomeçar a vida?
Ignoram-me. Não sou. Tenho vontade
de ser também um velho desde sempre.

Assim conversarão
comigo sobre coisas
seladas em cofre de subentendidos
a conversa infindável de monossílabos, resmungos,
tosse conclusiva.
Nem me vêem passar. Não me dão confiança.
Sigo, seco e só, atravessando
a floresta de velhos.

Chegou aquele momento da vida em que você já sabe:
quem é importante para você, quem nunca foi, quem não é mais e quem o será sempre.