Esta cache tem como objetivo dar a conhecer a história das piores cheias registadas em Alenquer.
No dia 25 de Novembro de 1967, num típico dia de inverno pelas sete da tarde, a chuva começou a cair intensamente em toda a região de Lisboa. De Cascais a Alenquer passando por Oeiras, Lisboa, Odivelas, Loures, Alhandra, Alverca e Vila Franca. Ao contrário do que seria de esperar à medida que as horas iam passando, a chuva, em vez esmorecer, vai engrossando cada vez mais, sem parar, até às primeiras horas da madrugada. Das 18 horas à meia-noite, a precipitação foi de 92 mm, “um recorde nos últimos 100 anos” como refere a imprensa da época.
A precipitação foi de tal forma intensa que, em poucas horas, todas as ribeiras e rios da região atingiram caudais extremamente elevados, extravasaram os seus leitos, destruíram pontes (em Alenquer, das quatro pontes que ligavam as duas margens do rio, apenas uma ficou transitável!), estradas, casas, condutas de drenagem e vias de comunicação. Com a cheia do rio a ultrapassar todas as outras cheias conhecidas, a morte e a destruição espalhou-se pelas margens do Rio Alenquer e espraiou-se pela vila.
Geografia da cheia
Em Alenquer, toda a “baixa” da vila ficou completamente inundada!
Da ponte do Barnabé (severamente danificada) à Romeira, ficou apenas lama, lixo e destroços. A fúria da água não poupou nada! Nem a forças das estruturas industriais existentes conseguiu enfrentar a força destruidora da cheia.
Na Fábrica de Cartão e Papel da Ota, as instalações foram completamente amputadas em cerca de 20 metros em toda a sua extensão com as bobines de papel e as pesadas máquinas transportadas pela enxurrada a distância inacreditável. Na Fábrica de Lanifícios do Tejo (Chemina) os danos que se verificaram foram severos. Na Moagem Hidráulica de Alenquer as perdas foram severas: para lá de equipamentos arrastados pela força da água, foram inutilizadas muitas toneladas de cereais e farinha que aí se encontravam a aguardar moagem ou transporte para os seus destinos. O mesmo destino teve cerca de mil toneladas de trigo que estavam armazenadas nos celeiros da FNPT (Federação Nacional dos Produtores de Trigo), destruídos pela água numa perda que se calculou na época em “mais de 3 mil contos” (cerca de 15.000 euros).
No centro da vila, residências, estabelecimentos comerciais e todo o tipo de instalações existentes foram inundados.
No “Cine Alenquer”, a sala de cinema da vila, a água subiu aos 3 metros e a plateia ficou totalmente inutilizada. O posto da PSP não escapou aos prejuízos e a Agência do Banco Fonseca & Burnay foi invadida pela água e pela lama (no meio da tragédia. Um pormenor curioso: na agência, o relógio existente parou às três horas e cinco minutos da madrugada do dia 26. Inconsciente testemunha da altura da água a essa hora: 3 metros!
Vítimas mortais
O número de vítimas mortais no concelho de Alenquer, nos dias seguintes (Diário Popular, 28-11-1967, balanço às 10 horas e trinta), é fixado em 62, deixando-se, no entanto, ressalvado que poderiam aparecer outros cadáveres em locais ainda não acessíveis. Na vila, foram contabilizadas10 pessoas (entre as quais 4 crianças); 29, em Cadafais, no Soupo, 1; em Refugidos, 7; e 15 no Casal Gois onde apenas sobreviveu um dos habitantes dos 16 habitantes.
No dia 2 de Dezembro, o jornal local A verdade refere 66 mortos, indicando apenas tratar-se do apuramento até essa data.
Prejuízos
Em casos como este nunca é fácil estabelecer quantitativos exactos que demonstrem a grandeza dos prejuízos. Os jornais da época falam em cerca de 150.000 mil contos (cerca de 750.000 euros), – uma cifra astronómica para a época! – que, dada a dimensão dos danos provocados pela cheia, não deverá estar longe da realidade. Aliás, no jornal O Século, de 28 de Novembro de 1967, o presidente da Câmara e o seu staff fazem uma primeira avaliação dos prejuízos em mais de 117.000 contos mais ou menos 583.000 euros).
Reconstrução e realojamento
Para lá das ações imediatas de limpeza e de reparação imediata dos estragos mais urgentes, houve necessidade de disponibilizar alojamento definitivo àqueles que tinham perdido o seu e conceder subsídios e crédito aos agricultores, industriais e outros agentes económicos que deles careciam para voltar a pôr de pé as suas empresas e explorações agrícolas.
A acrescentar ao cerca de meio milhar de contos (250.000 euros) de subsídios atribuídos, em 19 de Dezembro de 1967, aos primeiros 39 comerciantes atingidos pelas cheias, em Fevereiro de 1968, o Ministério da Economia, pôs à disposição dos comerciantes e agricultores lesados mais 2.300 contos: 1.700 contos em subsídios e 700 em empréstimos concedidos.
No apoio ao realojamento das famílias, em Alenquer, destacam-se duas entidades: uma, colectiva, a Fundação Gulbenkian que disponibilizou, de imediato, um subsídio de 50.000 contos para viabilizar de imediato a construção de novos alojamentos para as famílias que deles careciam (dois blocos de dezoito habitações cada um e inaugurados em 8 de Dezembro de 1968); a outra, individual, o senhor Jorge da Cunha e Carmo que doou os terrenos do Alto Cardal onde as habitações foram construídas e onde ainda hoje se podem observar.
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