A representação, anunciada em altos brados pelo ilustre Batulcar, deveria começar às três horas, e logo os ensurdecedores instrumentos de uma orquestra japonesa, tambores e tantãs, tocavam à porta.
Iniciou o espetáculo. Sendo os japoneses os melhores equilibristas do mundo, um executava um exercício tão gracioso das borboletas e das flores, outro brincava com velas acesas, que sucessivamente apagava quando passavam na frente dos seus lábios, e que tornava a acender uma na outra — sem por um instante interromper o seu jogo de prestidigitação. Um produzia, com piões giratórios, as mais inverossímeis combinações, outros corriam sobre cabos de cachimbo, sobre fios de sabres, sobre arames ou cabelos de verdade estendidos de um a outro lado do palco.
Mas a principal atração do espetáculo era a exibição dos “Nari-Longos”, assombrosos equilibristas colocados sob a proteção direta do deus Tingou, vestidos como os arautos da Idade Média, que traziam um esplêndido par de asas nas costas. Mas o que mais os distinguia, era o longo nariz com que suas faces estavam ornamentadas, e principalmente o uso que faziam deles. Estes narizes eram bambus, com o comprimento de cinco, seis e dez pés, uns direitos, outros recurvos, estes lisos, aqueles verruguentos. Ora, sobre estes apêndices, fixados de modo sólido, é que faziam todos os exercícios de equilíbrio.

Pirâmide humana japonesa
Para terminar a apresentação, anunciara-se especialmente ao público a pirâmide humana, em que uns cinquenta Nari-Longos deveriam representar o “Carro de Jaggernaut”. Mas, em vez de formarem a pirâmide tomando os ombros como ponto de apoio, deveriam sobrepor-se uns aos outros pelo nariz. Ora, um dos que formavam a base do carro havia deixado a companhia, e como bastava ser vigoroso e reto, Passepartout havia sido escolhido para o substituir.
Passepartout entrou em cena, e veio alinhar-se com seus colegas que deveriam figurar na base do Carro de Jaggernaut. Todos se estenderam no chão com o nariz para o céu. Uma segunda secção de equilibristas veio pousar sobre estes longos apêndices, uma terceira colocou-se por cima, depois uma quarta, e sobre estes narizes que só se tocavam pelas pontas, um monumento humano se elevou bem depressa até às frisas do teatro.
Os aplausos redobravam, e os instrumentos da orquestra explodiam como trovoadas, quando a pirâmide oscilou, o equilíbrio se rompeu, faltou um dos narizes da base, e o monumento desmoronou como um castelo de cartas...