O Teatro-Club de
Esposende foi projectado em 1908, ano do início da sua construção,
e inaugurado em 1911, representando um dos mais importantes valores
patrimoniais do Concelho, não tanto por caracterizar um
significativo período da história urbana de Esposende, mas pelo
invulgar valor dos arquitectos que envolveu: Ventura Terra, que o
concebeu para a realização de espectáculos de teatro e musicais;
Bernardo Ferrão que o adaptou a Museu entre 1992-1993. Ambos
depararam com a mesma dificuldade: o primeiro dada a forma e
limitações da parcela de terreno onde se iria inserir o projecto; o
segundo pela funcionalidade a que a adaptação a Museu
exigia.
Miguel Ventura Terra (1866-1919) caracterizou a
moderna arquitectura portuguesa, feita de materiais que se conjugam
em harmonia, como a pedra, o vidro, o azulejo, a madeira e o ferro
forjado, em detalhes decorativos ricamente elaborados, personifica
um dos modelos que influenciaram as gerações futuras de
arquitectos: o 'modelo progressista', em que a função prática se
valoriza, numa arquitectura de composição, deliberada,
racionalizadora dos espaços e dos materiais, respondendo às
necessidades da sociedade dominante da sua época mas ainda assim
preso a um certo formalismo arquitectónico.
Bernardo Ferrão (Porto, 1945), Arquitecto pela
Escola Superior de Belas Artes do Porto, de que foi assistente e
professor agregado , actualmente professor auxiliar da Faculdade de
Arquitectura da Universidade do Porto e Director do Instituto de
Teoria e História da Arquitectura, é também Consultor-Urbanista da
Câmara Municipal de Esposende e autor do projecto de adaptação do
edifício a Museu.
A Recuperação
Arquitectónica
A
recuperação arquitectónica do Teatro-Club, a par da sua
funcionalidade, do imediato papel de depositário e conservador dos
materiais à sua guarda, obedecendo à sua dupla função de expor e
conservar os testemunhos de uma memória colectiva, articulou dois
'tipos' arquitectónicos, o original, de Ventura Terra, que se
manteve no exterior e no tratamento volumétrico interior, e o de
Bernardo Ferrão, desenhando num quadro de renovação urbana um
equipamento cultural num contexto de recuperação arquitectónica,
visível no tratamento espacial interno, na harmonia e detalhe dos
elementos decorativos, conjugando a pedra e o azulejo com a mesma
coerência que Ventura Terra teria admitido, respeitando assim, para
além da funcionalidade futura do edifício, o espírito do edifício
na recriação de um ambiente próprio de uma época, assumido como um
espaço recuperado, a 'Sala dos Azulejos', onde o vidro, o azulejo e
a madeira se conjugam numa composição intencional com as aberturas
à luz que portas e janelas fazem inundar de cor e brilho, em jogos
de claridade e sombras.
Adaptação do Teatro-Club de Esposende a
Museu Municipal*
...'Esposende, antiga vila de pescadores e
marinheiros, assumiu também, a partir de meados do séc. XIX, a
vocação de estância balnear, num processo urbano paralelo e
contemporâneo ao de muitos outros aglomerados costeiros
portugueses. Desde então, a fixação temporária de veraneantes,
oriundos sobretudo do interior setentrional do país, modificou e
ampliou, face a novas necessidades e exigências, a expresssão do
velho aglomerado, num interessante processo urbano que Augustina
Bessa Luis magistralmente sintetiza, quando refere que período da
história'...Esposende tinha duas almas: a do sul, que era
piscatória e a do norte, que era banhista...'
Esta transformação da vila, que atinge o seu
auge já no dobrar do séc. XX, será protagonizada quer pela execução
de inúmeras residências de veraneio, quer pela edificação de alguns
equipamentos de siginficativa importância urbana: trata-se de
construções do maior interesse para a caracterização daquele
siginificativo período da história urbana de Esposende, cuja
preservação urge e, por isso se encontra prevista no planeamento
urbanístico que hoje disciplina a transformação do aglomerado.
Exemplos qualitativamente flagrantes dessa transformação urbana,
são, sem dúvida, o Chalet Nélia, o Hospital Valentim Ribeiro e,
justamente, o Teatro-Club de Esposende, todos aliás projectados
pelo mesmo arquitecto, Miguel Ventura Terra (1866-1919), nascido em
Seixas do Minho e formado na então Academia Portuense de
Belas-Artes.
Projectado e construído entre 1908, data da
escolha do local para a edificação, e 1911, ano da sua inauguração,
no período aureo da carreira do arquitecto, o Teatro-Club de
Esposende, então considerado pela imprensa local como ... obra
elegantíssima e artística... destinava-se à realização de récitas e
espectáculos teatrais, e posteriormente cinematográficos, servindo
simultaneamente de sede à Assembleia Esposendense, velha agremiação
sócio-cultural cujos estatutos datavam de 1879. O impacto social da
iniciativa e o programa de uso da nova construção, estiveram
certamente na base da escolha da sua localização, num das praças
mais representativas da Vila, onde se situavam já os dois edifícios
do maior significado urbano, a Câmara Municipal e a Igreja da
Misericórdia.
Extremamente condicionado pela forma e dimensão
da parcela onde teria de inserir-se, dificuldade que o projecto
sabiamente resolve através da sua volumetria e organização interna,
ao Teatro-Club se poderá aplicar também, o comentário de Ramalho
Ortigão a propósito de outros edifícios de Ventura Terra: ... A
nobreza do seu aspecto não se impõe por hiperbólicos artfícios
exteriores, antes se deduz, honradamente, da cultura e da dignidade
interior...
Lentamente perdido para os usos que lhe deram
razão de ser, o convívio social praticado no belo salão de festas
do rés-do-chão e a actividade lúdico-cultural levada a efeito na
curiosa sala de teatro situada nos níveis superiores, foi o
edifício ocupado nos últimos anos, e infelizmente, por uma
indústria de confecções. Pese embora a louvável preocupação dos
seus proprietários na preservação da construção, o tipo de
utilização a que o Teatro-Club esteve submetido encaminhou-o,
inexoravelmente, para a mais completa das degradações'.
*Bernardo Ferrão, in Roteiro, Ed. Museu
Municipal, Câmara Municipal de Esposende, 1993.
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