A gambúsia é muitas vezes confundida com o mítico gambozino. Vocábulos semelhantes estão na origem de tal confusão. Contudo, se a gambúsia é uma invasora que dificilmente se vai conseguir erradicar, o gambozino, por mais que seja procurado, nunca é encontrado. 'Gambozinos ao saco!' é uma expressão que quase todos já ouviram. No entanto, não há registos de quem já os tenha visto. 'O gambozino é uma espécie que não existe e que se usa para pregar partidas às crianças', explica João Lopes, biólogo do Fluviário de Mora. Os dicionários descrevem-nos como 'peixes ou pássaros imaginários, com que, por brincadeira, se logram os pacóvios mandando-os à caça ou à pesca desses animais'. Por isso, para além do nome, os gambozinos em nada estão relacionados com a gambúsia. Este peixe, porventura o mais insignificante das espécies que habitam nas nossas águas, é bastante conhecido devido à sua dispersão geográfica. Muito comum em água doce e salobra, tem um papel importante que quase ninguém conhece muito bem... A gambúsia é de facto um peixe pouco importante para a maioria dos pescadores de água doce. Quase todos o conhecem, mas ninguém sabe muito bem o seu nome e de onde vem este peixe. Excepto em estudos sobre esta espécie, provavelmente nunca ninguém perdeu muito tempo a escrever sobre este peixe, que por algum motivo se encontra espalhado por vários países e com um papel muito importante como adiante veremos. A Gambúsia holbrooki é um pequeno peixe originário da América Central, concretamente dos rios que vão desaguar ao Golfo do México. Neste momento, encontra-se espalhado por vários países da Europa, incluindo naturalmente Portugal, África, Ásia e Austrália. No nosso país é muito vulgar nas barragens, em especial no Centro e Sul e nas pequenas represas de rega, preferencialmente com alguma vegetação aquática. Curiosamente, esta espécie é um familiar bastante próximo dos conhecidos Guppis, o peixe mais popular nos aquários domésticos de águas tropicais, denotando-se facilmente os traços de família. As fêmeas são bastante diferentes dos machos incluindo o tamanho bem maior, que pode atingir os seis centímetros, contra os três e meio, nos machos. Estes possuem a particularidade da barbatana anal estar adaptada a aparelho reprodutor. São ovovivíparos, o que quer dizer que os filhotes desenvolvem-se dentro da barriga da mãe, onde os ovos são fecundados, nascendo já desenvolvidos. São completamente autónomos à nascença, necessitando apenas de se refugiar de imediato, visto que são insistentemente perseguidos pelos da sua espécie. As fêmeas são muito prolíferas podendo produzir cerca de cinquenta crias de mês a mês. Como se encontram constantemente em estado de gestação, as gambúsias são conhecidas em algumas regiões por “barrigudinhos”. Suportam grandes amplitudes térmicas, baixos níveis de oxigénio e até bastante salinidade na água, revelando-se verdadeiros “todo-o-terreno” da adaptação. O peixe do mosquito A particularidade mais importante deste pequeno peixe é que se alimenta sempre que pode, de larvas de mosquito. É um verdadeiro devorador, podendo ingerir por dia entre cem a duzentas larvas, segundo estudos efectuados. Em muitos países, onde foi introduzido para combate às pragas de mosquito, tem mesmo o nome de mosquitofish ou “peixe do mosquito”, nome por que também conhecido em alguns locais no nosso país. Este “insignificante” peixe fez inclusive, parte do programa da Organização Mundial de Saúde para combate à “doença do sono” em África, com a vantagem de ser um produto biológico. Como tudo, não há bela sem senão, e a esta espécie já foram atribuídos alguns prejuízos ambientais. Na Nova Zelândia e Austrália, estudos efectuados revelaram que as gambúsias preferiam muitas vezes como alimento, os ovos de espécies nativas, dizimando rapidamente as mais sensíveis, ou por competição directa por alimento, visto que são muito vorazes. Por sua vez, também se tornaram presa fácil e abundante de outros peixes predadores e aves aquáticas. Por cá, e uma vez que aparentemente não existem estudos sobre este possível impacto, as gambúsias são presença vulgar nos variados locais onde os pescadores de água doce as observam, sem no entanto saberem concretamente que peixe estão a ver. (Texto da minha autoria publicado no Correio da Manhã de 18 Agosto de 2002) Publicada por José Gomes Torres em 23:02 Etiquetas: Peixes de água doce
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